Era bonito e muito bem instalado o consultório da psicanalista Vilma
de quem me tornei paciente.
Ela era bonita, seios comportados, pernas bonitas e bem acabadas como
se eu pudesse envolver-me com ela ou ela comigo.
Enfim, um banquete para gostos finos e talvez por isso
o meu amigo a tivesse indicado e logo para mim
que não via mulher há muito tempo por conta da bagunça que a
minha vida era naquele momento.
Após contar a minha história ela, muito à vontade,
foi logo dizendo:
— Os fantasmas, dos quais você fala, não existem...
São coisas da imaginação, da sua cabeça, como se costuma dizer, mas não
se assuste que logo isso passa.
— Mas, e as correntes, doutora? Quem as, arrasta quando
a luz apaga e eu deito-me para dormir?
Eu falava e ela anotava numa prancheta e quando não
anotava ficava me olhando com aqueles olhos verde hortelã por detrás de
um par de óculos que eram ajustados a cada vez que
fosse dizer qualquer coisa.
Aliás, ela pouco ou nada falava além de ouvir.
Por isso talvez eu começasse a falar sozinho.
Falava no carro, no escritório e até no meio da rua
já me pequei falando sem precisar pagar o
que pago para a doutora ficar me olhando sem dizer nada.
Mas, será que ela escuta mesmo ou é coisa da minha
imaginação, como costuma dizer?
— O seu problema, disse puxando os óculos para cima
do nariz, é não ter com quem se abrir, contar os seus problemas,
falar das angústias e até de amor, você precisava falar.
Procure uma pessoa com quem possa falar de maneira franca e
aberta, alguém que entenda a sua falta de tempo para si
e para com os outros, que escute o que você tem para dizer
e até abraçá-lo quando você mais precisar ela o abrace.
— Mas quem estaria disposta a fazer isso por mim, doutora?
A quem eu poderia confiar a minha vida, como faço com a senhora?
— Olhe bem para mim — disse curvando-se na minha
direção e com certeza tocou a palma da mão no meu joelho
sem maldade nenhuma — Procure isolar-se um pouco.
Nada de escritório, de reunião dentro ou fora do horário
de trabalho e depois me fala.
Sumindo por duas ou três semanas nem os fantasmas que
você pensa escutar poderão encontrá-lo.
Não aconselho hotel nenhum que eu conheço,
mas uma casa longe de tudo e de todos lhe fará muito bem
e se tiver dificuldade de encontrar um lugar como esse
me fale que eu empresto uma onde vou descansar quando
estou muito estressada.
Não precisa pagar nada além das consultas.
A casa que me ofereceu era um bangalô lindo cercado de
verde por todos os lados, com barulhinho de água correndo e
tudo, fora os passarinhos me acordando pela manhã e
no pôr do sol se despedindo. Uma delícia de lugar.
Na terceira noite, já de madrugada, acordei com um barulho
na porta da frente, mas como a doutora garantiu que fantasma
não existe, virei para o canto tentando voltar a dormir,
mas quem disse que eu conseguia se havia alguém
ali dentro e mesmo na ponta dos pés a taboa corrida
do piso a denunciava.
Cobri a cabeça, mas deu para ouvir a porta do box
abrindo e fechando,
chuveiro sendo ligado e um forte cheiro de rosas
tomou o lugar.
Registro de chuveiro fechado.
Luz do box apagada, pés descalços pisando de leve
a madeira até o quarto. O perfume de rosa já não era tão claro,
estava mais para o de fruta madura, ou de mulher bonita,
como diz o poeta, mas assim mesmo arrepiei-me com ele
esgueirando como cobra por debaixo da minha coberta.
Do nada surgiu u'a mão no meu ombro
e alguma coisa tipo seios forçando as minhas costas.
Um beijo atrás da orelha, o hálito quente, gostoso e só.
Nem uma palavra se ouviu no recinto.
Eu, que pensei estar fugindo dos pesadelos nem dormir direito
eu conseguia.
Desde a chegada que não durmo sozinho.
Nos beijamos em algum momento?
Sim, em todos, nós nos beijamos.
Transamos? Sim, muitas vezes durante todas as
noites e durante todas as madrugadas,
mas falar que é bom não falamos.
Hoje, exatamente hoje, faz dois anos que
eu vim para cá, para fugir dos fantasmas que não
me deixavam dormir.
Eu continuo sem dormir, mas correntes também
não escuto e para ser sincero, eu acho que me curei só
não digo para ela.
Nem tão cedo tocarei no assunto se do jeito que está,
está bom, aliás muito bom, mesmo.
Não dá para me abrir para ela como a "doutora"
falou, até porque, quando "ela" chega é quando eu acordo
e quando ela volta é quando me deito para dormir.
silvioafonso
Com Canção
Marcos Valle
Samba de Verão
Indo sempre ao encontro
Seja dos pensamentos
Seja do pequeno momento
Seja do sonho Seja da ilusão
Vejo assim sempre indo
Sempre sentindo e permitindo
E que a vida seja longa
Que alegria infinita
E que a taça transborde
Que reencontro aconteça
Que antes do olhos se encontrarem
A toalha cai e tudo se faça emoção
Que mundo gire como um carrossel
E que os delírios transcedam a razão
Que a agua junte os corpos
E assim não haja mais nada entre os seres.
CatiahoAlc./Reflexo d'Alma
entre delírios e delírios
14 comentários:
Eu que queria conhecer essa doutora..... quem sabe ela me arruma um bangalô assim???
OU.. quem sabe é ela quem visita o amigo??
A música "Samba de Verão" é um show!! Particularmente, foi a música que solei quando fiz o teste para a Ordem dos Músicos do Brasil!!!
O nosso mestre Silvioafonso sempre com o texto afiado, mexendo com a nossa imaginação. Gosto muito do Marcos Valle, desde que ele começou. Fiquei assustado, esses dias, em saber a idade dele.. Post muito bem escolhido .Que a canção do dia, seja a mesma de todo o ano. Beijos e boa semana
CURADO!!!!
Remédio santo :)))
Catiaho do Blog Espelhando
Palhaço Poeta,
Seu texto é interessante e lúdico. Me lembrou do meu irmão Rogério que como bom manipulador era comum se envolver com as profissionais que o tratavam. Logo era uma mão na perna ou uma palavra solta. Nem lembro de por quantas ele passou ao longo de sua vida curta. Seu texto me fez pensar: elas as seduzia ou seria o contrário? Pq não? Como saber, não é mesmo?
Adorei o texto.
Bjins
CatiahoAlc...
Muito belo!
As palavras do poema são deliciosamente inspiradoras!
Gostei muito!
Um abraço!
Pois é amigo
vai que o bangalô está
no Airbnb?
Brigadin por ler aqui.
Bjins
CatiahoAlc.
Touché,
Que bom que você gostou
e muito obrigada por
sempre ler a gente.
Bjins
Mas não é?
Grata por sempre ler
aqui.
AS,
é uma alegria
ter vc aqui.
Bjins
Muy bello y profundo te mando un beso
O conto com a marca do Sílvio Afonso. O poema muito belo. Gostei de passar aqui.
Uma boa semana com muita saúde.
Um beijo.
Mais um excelente post.
O conto do Sílvio é magnífico.
Também gostei do Marcos Vale, que não conhecia.
E o seu poema é excelente.
Boa semana, amiga Catiaho.
Beijo.
Olá, Cátia, postei um comentário ontem, deve estar no Spam(na página dos comentários, tem de dizer que não é Spam e publicar, dá uma olhada!
beijinho
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